sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Democracia e comportamentos considerados anti-democráticos

O termo "democracia" surgiu na experiência grega de espaço público e permaneceu como um dos termos mais usados ao que tange a política do mundo contemporâneo. Dessa forma, a palavra "democracia" sobreviveu guerras, destruições em massa, bombas atômicas e perdurou no cenário interno e externo como um  dos símbolos da sociedade moderna. Entretanto, tanto seu sentido, forma de funcionamento e valor mudaram na medida em que os anos passaram e os conceitos das pessoas transformaram-se. Enquanto na Grécia, a palavra "democracia" era utilizada geralmente para se descrever uma forma de governo imperfeita, na Idade Contemporânea, ela caracteriza quase um ideal de forma de governo. Não que todos os Estados tenham se fundamentado sobre bases democráticas, mas um aspecto notável - mencionado, inclusive, por Bobbio em "Teoria Geral da Política" - é que até mesmo as ditaduras se camuflam sobre o termo "democracia". O que Bobbio quer dizer com isso é que até os governos autoritários da civilização ocidental estabelecem que são democráticos perante a comunidade internacional. O maior problema disso tudo é que, dessa maneira, as pessoas acabam confundindo falar de democracia com fazer democracia ou então misturam diversos termos políticos para chegar a uma determinada forma "ideal" de conduta. Um exemplo clássico é o que acontece na maior parte dos espaços públicos: eles se dizem abertos, e até certo ponto são, cada um pode manifestar sua opinião, mas então aparece algum ser com ideologia diversa dos demais e esse indivíduo é praticamente expulso desse espaço por vaias. O pior, entretanto, são os comportamentos implícitos. Há pessoas que se dizem abertas às opiniões diversas, mas quando as escuta faz "caras e bocas", reclama, e diz que o outro é maluco. E aí vem um grande dilema da vida: até que ponto Democracia  se caracteriza necessariamente pela Liberdade de Expressão? Escutar as opiniões alheias pressupõe respeitar todas elas? E o melhor: quais são os limites dessa Liberdade? Se um governo democrático pressupõe Liberdade de Expressão, é o primeiro ponto. Se Liberdade de Expressão não significa apenas ouvir, mas respeitar é outro. A partir daí pode se chegar ao choque entre se tudo é passível de ser escutado ou não.Essas são questões difíceis de enxergar no cotidiano, mas muito fáceis de se perceber em situações limites. Quer dizer, atitudes consideradas execráveis pela sociedade (como manifestação de racismo e desrespeito à moral) podem ser passíveis de serem defendidas em um espaço público, mesmo que a maior parte desse espaço seja totalmente contra? É algo a se pensar.



Por fim, deixo um estudo de caso:
Philip Pullman é um escritor britânico formado pela Universidade de Oxford. Ele vêm recebendo inúmeras críticas pelo título polêmico do seu último livro, "The Good Man Jesus and the Scoundrel Christ" (que pode ser traduzido como "o bom homem Jesus e o 'canalha' Cristo"). O vídeo é uma espécie de defesa que o autor apresentou, descando os elementos da liberdade de expressão.
(Ele me foi enviado por um aluno de Introdução à Ciência Política, em que eu sou monitora.)

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Qual o problema da esquerda brasileira?

Eu me considerava de esquerda, antes de entrar na universidade. Eu defendia uma sociedade igualitária, antes de entrar na universidade. Eu achava o comunismo até justo, antes de entrar na universidade. Eu não via tantos problemas em ditaduras como a de Fidel Castro, antes de entrar na universidade. Eu até simpatizava com Rousseau e achava Che Guevara uma graça, antes de entrar na universidade.

antes de entrar na universidade.

Um professor de História me disse uma vez, e na época eu achei um tanto enviesado, a seguinte frase: "quem nunca foi socialista na adolescência era sem coração e quem nunca deixou de ser depois dos 30 anos não era inteligente". Ou algo parecido. O que ele quis dizer, e é o que muitos afirmam, é que o socialismo/comunismo demonstram ideais típicos de jovens que querem mudar o mundo, típicos daquela idade em que tudo parece possível. Não é um sentimento negativo em si: essa esperança e vontade de lutar contra às injustiças. Entretanto, quando em exagero, é um caminho direto para a alienação. Ora, eu também fazia discursos eloqüentes, brigava com os meus pais, e escutava Punk Rock. Nunca fui anarquista, e achava que liberalismo era um palavrão, muitas vezes confundindo Política e Economia, um erro comum. Mas, após entrar na universidade, tudo mudou. O engraçado é que geralmente, eles fazem o caminho oposto: os playboys do Ensino Médio se encantam com o Manifesto do Partido Comunista, imprimem postêres de Karl Marx e começam a participar de movimentos sociais, quando passam no vestibular - principalmente se for para Sociologia. Mas, para mim, a primeira decepção com o Comunismo começou exatamente na leitura do Manifesto. E para Karl Marx eu tenho apenas uma palavra: vago. E não estou falando das obras econômicas do nosso camarada, mas simplesmente da obra que lhe deu mais sucesso entre o público juvenil. Ainda assim, ela não foi minha maior decepção com a esquerda. A maior decepção mesmo foi o movimento estudantil. Quando eu passei no vestibular, logo após o Ensino Médio, ainda tinha os mesmos ideais de sempre. De querer mudar algo. De lutar por condições justas. Esses ideais continuam, mas o que mudou de fato foi o meu conceito de justiça. Quando eu entrei na universidade, ela estava passando por um momento complicado: o reitor gastara não sei quantos mil em uma lixeira supostamente com o dinheiro destinado às pesquisas da universidade. E é claro que os estudantes pediam para a saída do reitor. Claro. Até aí, tudo bem. Então, vieram as assembléias estudantis. Geralmente começavam 12h e iam até mais de 14h. E a votação sempre era no final. Eu realmente queria me sentir parte da universidade, votar, participar, fazer parte do aparato político. Mas, veja bem, eu nunca gostei de faltar aula e as assembléias eram longas demais. No entanto, eu fui em todas. E só consegui votar uma vez. No começo, eu até me divertia com as plaquinhas engraçadas ("libertem o tibet"), as batucadas, as risadas, depois isso só foi formentando e cada vez mais distorcendo a seriedade, se é que há, do movimento. Em primeiro lugar, as discussões duravam demais: algumas vezes, depoimentos desnecessários relativos a outros assuntos (REUNI e afins) que não estavam ligados ao caso Timothy. Mas esse não era o pior. O pior mesmo era a propaganda partidária: uma assembléia que se dizia estudantil e eu tive que aguentar nada mais nada menos, e contadas no relógio, 1h APENAS de propaganda partidária, e é claro, só de partidos de esquerda: PSOL, PSTU e etc Incontáveis são os broches e panfletos que eu ganhei. E aí, chegamos na questão da representatividade. Há quem diga que essa crise não existe: "os estudantes representam quem vai nas assembléias". Mesmo assim, isso não é verdade. De 20000 alunos, 200 vão a essas assembléias, quando o DCE tem sorte. E ainda assim, acredito que pelo menos alguns deles sejam de centro ou até mesmo de direito, pelo menos 5% deles. Mas a assembléia insiste em levantar a bandeira vermelha, exibir as camisetas do Che (pop-art marxista!!!) e levantar os falsos ideais de fraternité e igualité, quando tudo isso é mascarado através de representação partidária. Bandeiras do PSOL e outros partidos sempre tremulando através das amnifestações "estudantis". Sinceramente, eu acho a utilização desse nome - "movimento estudantil" - uma ausência de legitimidade (e perdoem o termo, uma puta falta de vergonha na cara). Os estudantes são de direita, esquerda, centro e eu dúvido mesmo que a maior parte deles sejama filiados ao PSOL. Então porque, "companheiros", levantar essas bandeiras que não são em nada a cara da identidade estudantil? Outro aspecto que contribui mais do que tudo para a imagem que eu tenho do movimento, foi a falta de democracia. Eles sempre tentam defender os fator horizontal, a assembléia em que todos podem se pronunciar, mas quando um menino do CaDIR foi dar a opinião do Centro Acadêmico, foi vaiado por todos os garotos com a camisa do Che e todos os outros que estavam batucando antes e todos aqueles que possuiam opiniões contrárias. Penso que democracia pressupõe respeito às opiniões diversas. E aí, eu devo concordar com Voltaire: “Não concordo com nenhuma palavra que vc diz, mas, defendo até a
morte o direito de pronunciá-las”.
E isso está totalmente ausente nas assembléias Porque qualquer opinião contrária é declarada ilegítima, e vai tentar se pronunciar com os "sociais", que só falta eles te apedrejarem.  E eu falo por experiência própria, porque muitas vezes fui chamada de neoliberal. E esse enfim é o maior problema da esquerda em geral: essa visão maniqueísta e essa tentativa de limitar o que é e o que não é. Essa divisão metódica de "bem" e "mal", onde os neoliberais são os vilões e as pessoas de direita fazem parte do lado negro da força. Essa não-aceitação de idéias e sugestões. Essa linha grossa e firme que define esquerda e direita, respectivamente bem e mal, social e "patricinha". Esse pensamento de achar que quem é de direita só se preocupa com a propriedade privada, e etc. Essa ilusão de heroísmo. E principalmente, essa hipocrisia. Hipocrisia sim, porque a maior parte das pessoas que falam mal da direita, possuem o carro próprio e uma vida confortável. É muito fácil ser socialista quando se tem uma vida confortável. Porque é muito fácil falar. Toda vez que eu vejo um menino andando com uma camisa do Che Guevara eu não consigo reprimir um único pensamento: "Tantas pessoas, jovens e adultos, morreram nas mãos desse cara e esse babaca anda desfilando com esse lixo de camisa sem ter ao menos noção do número de pessoas assassinadas, da quantidade de litros de sangue derramada simplesmente porque Che Guevara era um lunático metido a guerrilheiro." Pop-Art marxista. De culto ao personalismo, nós temos Hitler e Stálin, os extremos se aproximam, milhões de mortos. Se antes eu defendia uma sociedade igualitária, hoje eu prefiro uma meritocrática. Pois se existe uma verdade absoluta, essa é a que diz que não somos todos iguais. Não somos todos iguais, porque temos necessidades e capacidades diferentes. O que falta é as pessoas aprenderem que isso NÃO é ruim. Uma sociedade justa para mim seria aquela em que houvesse igualdade de oportunidades, em que as profissões ganhassem salários mais justos, respeitando-se o direito de escolha. Porque há muitas sociedades capitalistas, em que esse direito de escolha não existe por causa da falta de recursos. Mesmo assim, a solução não é tirar de quem tem, mas impedir que se tenha de menos.É prover aquelas necessidades básicas, direitos fundamentais e dar a oportunidade de crescimento, considerando as diferenças individuais. Porque elas existem e preconceito mesmo é ignorar a existência. Porque afinal, nem tudo na vida se resolve ocupando.

PS: Esse post foi altamente pessoal e não tem nenhum compromisso com a imparcialidade jornalística, então é apenas uma expressão de opinião, do mesmo modo que eu tenho direito de pensar assim, você tem todo o direito de discordar. Só peço apenas que respeite assim como eu respeito o seu direito de discordar.